09
Set09
O «sim» não foi «moderno»
Tiago Moreira Ramalho
Este não é, infelizmente, um assunto da campanha pelo que tive dúvidas sobre se deveria ou não trazê-lo para aqui, mas já que o Miguel Reis Cunha (MRC) me fez o favor de dar o primeiro passo, sigo-o.
O que o MRC pede (o aborto apenas como solução extrema) é algo de irrealizável e, honestamente, pouco me importa se é feito em situações extremas ou de forma leviana. A discussão verdadeiramente importante é se é legítimo um Estado apoiar duplamente a prática em si (retirando-lhe as punições anteriormente previstas e permitindo o aborto no Serviço Nacional de Saúde). E para isso, temos de pensar se o aborto é ou não uma prática eticamente aceitável.
Na altura do referendo, Marcelo Rebelo de Sousa foi gozado por ter feito uma das mais importantes denúncias de toda a campanha: a pergunta era claramente mentirosa. O referendo apenas questionava os cidadãos sobre se queriam ou não a prisão até três anos para mulheres que abortassem. Em parte nenhuma do papelinho vinha a pergunta: «aceita que se façam abortos gratuitos no SNS?». A diferença, que para uns é de somenos, é de uma importância extrema. Hoje, os impostos de todos nós – dos que votaram sim, dos que votaram não e da esmagadora maioria que se absteve – financiam uma prática cuja moralidade não é, de todo, consensual.
Além disso, não é nenhum «pecado» questionar o referendo que foi feito. Dez anos antes do último referendo já havia sido feito um. Num referendo, o povo português disse que não queria uma despenalização nem tampouco uma liberalização do aborto. No outro disse que sim à primeira e não se pronunciou sobre a segunda. A mudança drástica de opinião da população portuguesa em escassos dez anos não é nenhuma evidência de modernidade ou evolução, apenas prova que esta é uma questão que grita por mais debate, mais esclarecimento, mais discussão. Verdadeira discussão.