Transferências à esquerda*
«O PS confessou tudo esta semana: se o deixarem no governo, continuará a fazer o que tem feito. Até ver, esta contumácia não fez voltar atrás as personalidades e famílias da "esquerda" em migração para as listas de candidatos e apoiantes do PS. Entre si, José Sócrates e António Costa juntaram uma razoável colecção de escalpes numa área até agora indignada com o governo. Haverá quem veja aqui apenas "incoerência" e "venalidade". Mas há outras bases para esta mudança de camisolas. Os activistas podem argumentar que, ao enxertarem-se no PS, estão apenas a tentar que as suas causas dêem fruto: afinal, o aborto é hoje pago por todos os contribuintes graças a Sócrates, e não por causa de Louçã. Para o PS, num país sem a "guerra cultural" à americana, as causas da actual esquerda urbana têm custos baixos: o patrocínio das "minorias" não é a reforma agrária. Este esquerdismo satisfaz uma classe média que vota na "esquerda da esquerda" como quem dá para os peditórios: apenas para descarregar a consciência, e não para pôr em causa os fundamentos do seu poder e bem-estar. Chegará assim o casamento gay para dar ao voto no PS, apesar das "políticas neo-liberais", o mesmo efeito terapêutico do voto no BE? Ou será ainda preciso meter medo com o "regresso da direita"? Em tempo de transferências, o programa do PSD está a fazer muita falta ao PS.»